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The Normal Heart

Em 2004, há dez anos atrás, o fenômeno causado pela série Lost já era um prenúncio da ótima qualidade artística e conceitual das produções realizadas pela TV. Anos foram passando e a qualidade chegou a níveis tão alarmantes que, infelizmente, os cinéfilos começaram a reconhecer que o melhor da dramaturgia audiovisual advinha da TV e não mais do cinema. Prova disso, basta assistir Breaking Bad, que é uma obra prima do quilate da trilogia O Poderoso Chefão.  Agora, temos um problema muito mais grave: quando o melhor filme da temporada, que dificilmente deve ser batido, é produzido pela TV, não será visto em nenhum cinema e nem vai concorrer ao Oscar. The Normal Heart é um dos filmes mais importantes sobre o surgimento da AIDS e discute como nossa visão preconceituosa transformou a tal "praga gay" na doença mais impactante da história da humanidade.

O longa mostra o início da AIDS na década de 1980, a desinformação sobre a doença que, por falta de um nome, era denominada câncer gay. Diante das primeiras mortes, o escritor Ned Weeks, numa estupenda atuação de Mark Ruffalo, começa uma luta e o ativismo para orientar e tentar salvar os milhares de homossexuais da cidade de Nova York. Claro que não foi fácil dizer para uma geração que passou a década de 1970 buscando o amor livre, que deviam, a partir de agora, evitar o sexo ou, ao menos, não praticá-lo com diferentes parceiros. O filme explora de maneira brilhante esse paradoxo e essa dificuldade da comunidade gay se juntar para enfrentar o problema. Junte a isso preconceito e algumas doses de preguiça política. Temos então um filme espetacular. Pense meu amigo, a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida-AIDS foi identificada em em 1981, mas só em 1985 foi criado um teste sorológico para diagnóstico do HIV. Convenhamos, muita gente fingiu que não era com eles e deixou milhares de pessoas definharem até a morte. Ah, ainda foi pior. Outras milhares de pessoas assistiram seus entes queridos minguarem até o fim. Se isso não basta para você correr e assistir esse filme, desculpe, mas pode fechar a aba do blog.

O roteiro fantástico de Larry Kramer, baseado na peça homônima escrita por ele, é conduzido com suavidade pelo diretor Ryan Murphy (Comer, Rezar, Amar), contudo quem se aproveita mesmo dessa grande oportunidade é o vasto elenco, em que, mesmo com poucas aparições, há tempo para cada um mostrar seu talento e trazer o espectador para dentro desse dilema, que apesar de ficcional, deve ter sido muito doloroso à época. Vale nota o ótimo trabalho de Matt Bomer, o par romântico com a personagem de Mark Ruffalo, que me remeteu ao igualmente importante filme sobre o mesmo tema, Clube de Compras Dallas. Quem surpreende é Jim Parsons que mostra que há muito mais nesse bom ator além do Sheldon de The Big Bang Theory.

The Normal Heart é um filme fundamental para compreender o início da AIDS e o posicionamento da comunidade gay diante do fato. Curiosamente, foi a TV também que nos propiciou outra boa reflexão sobre o assunto na ótima mini-série Angels in América, mas já tratando da crise causada pela doença nos EUA após 1985. Entretanto, a questão mais importante não está dentro do filme, mas fora dele. Por que uma história tão significativa, densa e impactante não é produzida pelos estúdios de cinema, mas sim pela HBO? Será que homens nus e cenas de sexo homossexual não rendem boa bilheteria ou assustam demais os velhinhos votantes da Academia (para o Oscar)? Enquanto o cinema se acovarda em sua mesmice, a TV leva aos espectadores algo útil, inteligente, reflexivo e que, muitas vezes, nos incomoda. Agora imagine ver obras primas como The Normal Heart com apenas um clique no controle remoto? Os estúdios devem se preocupar, pois outra praga, não aquela do início da década de 1980, vai ceifar ainda mais espectadores do cinema. A diferença é que o Hollywood sabe a causa e a consequência, mas assim como no filme, os responsáveis não se interessam muito.

Hoje, segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas HIV/Aids (Unaids), o número de pessoas infectadas com o vírus no mundo está estável: 35 milhões. Mas a epidemia já matou 49 milhões, das 78 milhões de pessoas infectadas desde a década de 1980. No Brasil, a estimativa é de que 1,6 milhão de pessoas são portadoras da doença. Trecho matéria O Globo, 16//7/2014



The Normal Heart  (2014)
Direção: Ryan Murphy
http://www.imdb.com/title/tt1684226/

Gilvan Marçal - gilvan@gmail.com -

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